Monthly Archives: May 2007

Onde é que eu tinha parado mesmo?

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Sem mais nem menos, sem nenhum sinal que os antecedesse ou fizesse prever a sua vinda, tanto o Zezinho como o Ricardinho voltaram a aparecer na aldeia que os tinha visto nascer. Disse quem apreciou a aproximação daqueles dois “estranhos” que eles não pareciam ser nada de confiança: o seu aspecto de vagabundos famintos, vestidos de negro da cabeça aos pés, a precisarem de levar com uma mangueirada pelo costelo abaixo, fez voltar muitas cabeças para trás. E de facto, ao princípio, ninguém os reconheceu. Estavam mais altos, mais espadaúdos. Um tinha deixado crescer o seu cabelo escuro e trazia-o atado num rabo-de-cavalo sebento, diga-se. A barba ainda rarefeita, espalhada aqui e acolá, já lhe dava um certo ar de rapazola gingão, de alguém que já apreciava prazeres terrenos. Estava magrito, notavam-se-lhe os maxilares salientes, bem como as mãos compridas, com dedos finos e unhas algo sujas e maltratadas. Já o outro parecia não ter crescido nem um centimetro; continuava o meia-leca do costume, mas com mais 15 quilos em cima, à vontade. As bochechas bem rechonchudas e vermelhas, sinal de saúde, não enganavam ninguém: por onde quer que ele tivesse andado, este rapaz tinha tratado muito bem de si próprio. Cabelo aparado, face barbeada, sorriso de orelha-a-orelha…bem diferente do rapazito introvertido de há uns tempos atrás. Traziam ambos sacos de viagem, bem recheados, com quê é que não se percebia.

E lá vinham os dois, estrada acima, pela única estrada que cortava a aldeia, numa alegre cavaqueira, a esbracejarem, com passos firmes, como se regressassem a casa num dia normal. Cumprimentaram amigavelmente quem os micava e sobre eles cochichava e dirijiram-se às suas casas, ambas situadas no final da ruela. E só assim é que os velhotes e as velhotas, sentados nos seus bancos de pedra, extensões das casas, com ar de embasbacados, de quem tinha visto fantasmas, finalmente reconheceram aqueles dois gaiatos que, do mesmo modo que desapareceram, repentinamente apareceram.

À descoberta…

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I can write the saddest lines tonight.

Write for example: ‘The night is fractured
and they shiver, blue, those stars, in the distance’

The night wind turns in the sky and sings.
I can write the saddest lines tonight.
I loved her, sometimes she loved me too.

On nights like these I held her in my arms.
I kissed her greatly under the infinite sky.

She loved me, sometimes I loved her too.
How could I not have loved her huge, still eyes.

I can write the saddest lines tonight.
To think I don’t have her, to feel I have lost her.

Hear the vast night, vaster without her.
Lines fall on the soul like dew on the grass.

What does it matter that I couldn’t keep her.
The night is fractured and she is not with me.

That is all. Someone sings far off. Far off,
my soul is not content to have lost her.

As though to reach her, my sight looks for her.
My heart looks for her: she is not with me

The same night whitens, in the same branches.
We, from that time, we are not the same.

I don’t love her, that’s certain, but how I loved her.
My voice tried to find the breeze to reach her.

Another’s kisses on her, like my kisses.
Her voice, her bright body, infinite eyes.

I don’t love her, that’s certain, but perhaps I love her.
Love is brief: forgetting lasts so long.

Since, on these nights, I held her in my arms,
my soul is not content to have lost her.

Though this is the last pain she will make me suffer,
and these are the last lines I will write for her.

Pablo Neruda (Twenty Poems of Love)

Certos blogs são como um filho

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E este meu cantinho, onde me exponho mais para um público menor e mais selecto, é um desses, na medida em que tem um pai e uma mãe. O pai não é desconhecido, aliás, teve um papel bem mais preponderante no aparecimento do filhote do que eu, já que foi ele quem deu o primeiro passo, após largos meses de convivência virtual sem nunca nos termos visto. Até ao dia de hoje continuamos sem pôr a vista em cima um do outro, e os desaparecimentos dele são constantes. Contudo, as suas frequentes ausências não foram impedimento para que o nosso filhote alcancasse hoje a bela idade de 1 ano. Posso afirmar que ele, o pai, fez o filho e eu, a mãe, encarrego-me da sua educação… à moda antiga.

É giro vê-lo crescer, sim senhora 🙂

Self-reflection

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“Amazing how easily I can talk to complete strangers and open up about more private affairs. What I think most do in their daily lives, with their friends, relatives, close ones, I seem to be doing faster with unknown ones. The fact that it’s been happening for many years now just confirms my dual side personality. Have I regretted any of this? No, I have not. Actually, it has allowed me to get to know myself a lot better and what I want and need in many areas of my personal life. Will it go on? Most likely, as it makes up for what I lack and am unable to do. Is it right? Maybe not, but it’s how things stand right now and I feel happy this way.”